Por Maria Aparecida Custódio*
Imagine que você e outros tantos milhares de candidatos deverão fazer uma redação – em geral de gênero dissertativo – sobre um único tema, proposto pela banca examinadora. O desafio é: como produzir um texto diferenciado dos demais, que se destaque por ser mais qualificado? Em suma, como alcançar a originalidade?
Ser original significa fugir das frases feitas, das fórmulas prontas – ou seja, de expressões que, de tão desgastadas, já caíram no lugar-comum. Tais expressões são conhecidas também como clichês ou chavões, e não raro denotam falta de reflexão por parte do candidato. Somente a leitura – diversificada e frequente – pode livrá-lo das armadilhas dos clichês. Bons leitores contam com inúmeros recursos linguísticos que lhes permitem traduzir, com precisão, ideias e opiniões, contribuindo assim para a devida valorização do que escrevem. Contudo, se você se distrair e usar clichês em sua redação, tente eliminá-los antes de passar o texto a limpo.
Há clichês argumentativos, como os apontados abaixo, além de muitos exemplos de clichês encontrados com frequência em textos de vestibulandos e concurseiros, como “pedra sobre pedra”, “encerrar com chave de ouro”, “quatro cantos”, “estaca zero”, “arregaçar as mangas”, “assistir de braços cruzados”, “de importância vital”, “esmagadora maioria”, “trata-se de mera coincidência”, “pura realidade”, “verdade nua e crua”, “única e exclusivamente” etc.
Para não cair na armadilha do lugar-comum, pergunte-se: o que eu realmente quero dizer com isso? Em seguida, selecione, de seu repertório lexical, palavras que sejam adequadas ao que você quer exprimir.
“Desde os primórdios da humanidade, o homem tem-se mostrado cruel com seus semelhantes.”
Procure ser mais específico e situe melhor o leitor em relação ao tempo. Do mesmo modo, evite iniciar o texto com “Desde a Antiguidade”, “Atualmente”, “Hoje em dia” etc.
“As pessoas saem de casa sem saber se vão voltar”
A insegurança presente no cotidiano pode ser denunciada de inúmeras maneiras. Procure valer-se de exemplos que ilustrem suas ideias. Sugestão: “Inseguras, as pessoas sentem medo do que lhes possa acontecer até mesmo quando se dirigem ao trabalho ou à escola”.
“É preciso lembrar que dinheiro não traz felicidade.”
Críticas aos malefícios que o dinheiro pode trazer em geral tendem a reproduzir o pensamento comum. Devem, portanto, ser evitadas, até mesmo pelo fato de parecerem demagógicas.
“As pessoas mal conseguem respirar nesta selva de pedra.”
A expressão “selva de pedra” tem sido empregada nas mais diferentes situações. Em vista disso, recomendamos: seja mais específico. Sugestão: “Nas metrópoles, o índice de poluição do ar vem aumentando a cada dia”.
“Já não se fazem mais pais como antigamente.”
A afirmação está sujeita a diferentes interpretações. Verifique o contexto em que está aplicada para proceder às devidas modificações. Sugestão: “O conceito de paternidade sofreu diversas alterações no último século”.
“O efeito estufa nada mais é que a vingança da Mãe-natureza.”
No exemplo, verifica-se não apenas a ocorrência de um clichê, mas também de um conceito equivocado acerca da responsabilidade da natureza sobre o efeito estufa. Fique atento! Sugestão: “O efeito estufa decorre da concentração, na atmosfera, de gases que retêm a radiação solar na superfície terrestre, gerando assim o aquecimento global”.
“A juventude é o futuro do país.”
Por ser vaga, a afirmação dá margem a muitas maneiras de interpretá-la. Portanto, procure ser mais específico quando for explicar o porquê de a juventude representar o futuro do país. A sugestão a seguir contempla apenas uma possibilidade: “É nos jovens que o país deposita a esperança de mudanças significativas, sobretudo no cenário político”.
“Nem os monstros sagrados da literatura e do cinema escaparam da crítica.”
A utilização da expressão “monstros sagrados” pode sugerir desconhecimento, por parte do candidato, a respeito da identidade de artistas e atores. Para evitar essa impressão, faz-se necessário nomear os referidos “monstros”.
“Apesar de tudo, ainda há uma luz no fim do túnel.”
Em afirmações amplas e, portanto, vagas como esta, recomenda-se prestar atenção ao contexto. Sugestão: A despeito dos obstáculos, ainda existe a possibilidade de se reverter o quadro de corrupção que assola o Congresso. Para isso, precisamos propagar a importância da participação nas eleições por meio do voto”.
“O governo precisa dar mais atenção à voz rouca das ruas, que clama pelo fim da impunidade.”
Novamente, recomendamos maior precisão – no caso, quando forem feitas sugestões acerca das medidas necessárias ao combate à impunidade. Sugestão: “É preciso que nossos representantes políticos prestem mais atenção às reivindicações dos eleitores, que já não aceitam assistir passivamente à impunidade”.
“Se cada um dizer a sua parte, certamente viveremos num mundo melhor.”
Por tratar-se de sugestão vaga, cabível em inúmeras situações, mais uma vez recomendamos que o candidato/estudante pormenorize suas ideias, deixando claro ao que ele se refere. Sugestão: “É preciso que tanto os cidadãos quanto as autoridades e demais instituições se empenhem no cumprimento de suas responsabilidades, a fim de que se promova maior estabilidade social”.
“É conveniente para o governo que a população permaneça sem instrução, porque assim é mais fácil manipulá-la.”
Evite a tendência simplista de atribuir ao governo a responsabilidade direta por todos os problemas do país. Procure aprofundar a análise do assunto que se está discutindo. Sugestão: “Não se nota empenho, por parte das autoridades, em investir na qualidade da educação, o que pode manter a população na ignorância, como refém das promessas eleitorais”.
“Em relação à crise aérea, ainda não se conseguiu chegar a um denominador comum. Continua-se num jogo de empurra-empurra sobre quem tem culpa pelos recentes acidentes ocorridos no país.”
É comum, em se tratando de temas polêmicos, incorrer na repetição do que os veículos de comunicação vêm divulgando. Deve-se atentar aos riscos de cair na retórica vazia.
* Maria Aparecida Custódio é professora de Língua Portuguesa, responsável pelo Laboratório de Redação do Colégio e Curso Objetivo.
Fonte: Especial Redação 2009, Revista Língua [com adaptações].

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